Com a lupa do D-Taimes focada nas entranhas do poder, Alice Drummond traz à tona um episódio que reacende o debate sobre a ética e a transparência na administração pública brasileira. A Controladoria-Geral da União (CGU), guardiã da probidade, estendeu um “tapete vermelho” para a Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag), uma entidade que se encontra sob investigação de múltiplos órgãos por supostas fraudes massivas no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
A CGU e a Contag: Um Diálogo Institucional Controversa
O encontro, ocorrido em 5 de agosto, na sede da CGU, em Brasília, entre os principais auxiliares do ministro Vinícius Carvalho e a cúpula da Contag, surge em um momento delicado. A apenas uma semana antes, a própria Controladoria-Geral da União havia emitido uma nota técnica apontando que a confederação tentou, de maneira flagrante, descontar benefícios de pelo menos 22 pessoas já falecidas há mais de três meses. Essa revelação, que chocou a opinião pública, impulsionou a abertura de um Processo Administrativo de Responsabilização (PAR) contra a Contag, com base na Lei Anticorrupção, com previsão de conclusão até junho de 2026.
As investigações não param por aí. Além da CGU, a Contag é alvo da Polícia Federal e de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Congresso Nacional, que apura as irregularidades no INSS. Relatórios da auditoria da CGU indicam a apresentação “massiva” de autorizações inaptas para descontos e a suposta produção de documentos falsos para obtenção de acordos com beneficiários. Adicionalmente, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) informou à CPI do INSS que a Contag movimentou impressionantes R$ 2 bilhões em um ano, com parte dessas transações classificadas como “suspeitas de irregularidades, podendo caracterizar desvio com fraudes”.
Laços Políticos e Questionamentos sobre a Independência
A complexidade da situação se adensa com os notórios laços políticos da Contag. A entidade é historicamente próxima ao Partido dos Trabalhadores (PT), legenda do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e conta com quadros filiados à sigla. Exemplo disso é Aristides Veras, ex-presidente da Contag e irmão do deputado federal Carlos Veras (PT-PE). A confederação reúne ainda importantes movimentos sociais e sindicais, como a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), pilares de apoio aos governos petistas.
Essa proximidade é evidenciada pela intensa agenda da Contag com o governo federal. No último ano, antes de se tornar alvo da Polícia Federal, a entidade foi recebida pelo presidente Lula no Palácio do Planalto em abril de 2024 – uma audiência que não acontecia há sete anos – além de ter se reunido com ao menos seis ministros.
A justificativa da CGU para o encontro com a Contag, segundo a pasta, foi de um “diálogo institucional” para tratar de uma auditoria sobre descontos de beneficiários do INSS, negando qualquer conflito de interesses. A Controladoria ainda destacou que a agenda foi publicada para assegurar transparência, mas se recusou a enviar a ata da reunião. A Contag, por sua vez, defende que o encontro tratou exclusivamente das reivindicações da agricultura familiar, parte do “Grito da Terra Brasil”, e negou ser investigada por fraude.
O Cidadão no Centro do Furacão
Como analista do D-Taimes, questiono: o que significa “diálogo institucional” quando uma das partes está sob investigação pesada pela própria instituição que a recebe? A recepção da cúpula da Contag na CGU, em meio a acusações de desvio de verbas e fraude contra beneficiários do INSS – muitos deles idosos e vulneráveis –, levanta sérias dúvidas sobre a independência e a imparcialidade dos órgãos de controle.
Decisões tomadas em Brasília, nos gabinetes e nas mesas de negociação, têm um impacto direto e profundo na vida do cidadão comum. As supostas fraudes no INSS não são meros números; elas representam a privação de direitos e a subtração de recursos de quem mais precisa. A falta de clareza e a recusa em disponibilizar a ata da reunião apenas aprofundam o véu de desconfiança em um momento em que a sociedade clama por mais transparência e rigor ético na gestão dos recursos públicos.
O compromisso com o jornalismo investigativo do D-Taimes nos impulsiona a continuar questionando as dinâmicas de poder e as interseções nebulosas entre o político e o corporativo. A integridade da administração pública e a proteção dos direitos dos cidadãos devem estar acima de quaisquer laços ou conveniências políticas. A população merece respostas claras e ações firmes, não apenas “diálogos institucionais” que parecem ignorar a gravidade das acusações.
