A Chama da Contradição: Bolsonaro e a Tornozeleira Violada
Por Alice Drummond, D-Taimes
Brasília – A cena é, no mínimo, insólita e carregada de simbolismo político e jurídico. Jair Bolsonaro, ex-presidente da República, sob prisão domiciliar, admitiu ter tentado violar sua tornozeleira eletrônica usando um ferro de solda. A confissão, feita a agentes da Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal na manhã de sábado, 22 de novembro, não apenas confirmou as suspeitas, mas também lançou uma nova luz sobre a postura de figuras públicas diante de restrições judiciais.
As imagens do equipamento, formalmente comunicadas ao Supremo Tribunal Federal (STF), revelam a extensão da tentativa: a tampa da tornozeleira estava comprometida “de fora a fora”, com o plástico derretido e marcas de queimadura evidentes. “Meti um ferro quente aí. Curiosidade”, teria dito Bolsonaro, um depoimento que soa como uma justificativa pálida para um ato com profundas implicações. A pulseira, surpreendentemente, permaneceu intacta.
A admissão veio no rastro de uma decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que havia decretado a prisão preventiva do ex-presidente na sexta-feira, 21. A justificativa de Moraes para a conversão da prisão domiciliar em preventiva era clara: o risco de fuga, potencializado por condutas que denotavam desrespeito às condições impostas pela justiça. A tentativa de violação da tornozeleira, nesse contexto, reforça as preocupações do judiciário.
Enquanto a notícia se espalhava, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho mais velho do ex-presidente, buscou mobilizar a base de apoio, convocando militantes para uma vigília na porta do condomínio onde seu pai cumpria a prisão domiciliar. Um movimento que, para muitos analistas, tenta transformar um revés judicial em capital político, reforçando a narrativa de perseguição.
A Secretaria de Estado de Administração Penitenciária agiu rapidamente, substituindo o equipamento danificado minutos após a meia-noite de sexta-feira. Agora, a defesa de Bolsonaro tem um prazo de 24 horas, estipulado por Moraes, para se manifestar sobre o incidente. Após a resposta, a palavra final será do procurador-geral da República, Paulo Gonet.
O episódio da tornozeleira eletrônica não é apenas um detalhe pitoresco em um processo judicial complexo. Ele expõe a fragilidade do respeito às instituições e às decisões judiciais por parte de alguns atores políticos de alta relevância. Para o D-Taimes, este evento sublinha a constante tensão entre o poder político e a exigência de conformidade com o Estado de Direito, um desafio contínuo para a democracia brasileira. A “curiosidade” de Bolsonaro, ao tentar derreter o monitor, é um lembrete contundente de que, no Brasil, as chamas da polarização política ainda ardem, e o papel do judiciário na manutenção da ordem democrática é mais crucial do que nunca.
