Em uma investida para estancar um déficit bilionário, os Correios anunciaram um plano de reestruturação que inclui um novo programa de demissão voluntária (PDV) e o fechamento de mil agências consideradas deficitárias. A medida, que busca um empréstimo de até R$ 20 bilhões para retomar o equilíbrio financeiro em 2026 e gerar lucro em 2027, levanta questionamentos profundos sobre o futuro da estatal e seu papel social.
Como Alice Drummond, repórter do D-Taimes, mergulho nas entrelinhas dessa decisão. Em Brasília e nos grandes centros financeiros, a linguagem é de eficiência e sustentabilidade. Contudo, a pergunta que ecoa é: a que custo?
Em 2024, os Correios fecharam o ano com um prejuízo de R$ 2,6 bilhões. Diante desse cenário, a reestruturação se desdobra em três fases — recuperação financeira, consolidação e crescimento — prometendo expansão no e-commerce e parcerias estratégicas. A perspectiva de fusões, aquisições e reorganizações societárias visa aumentar a competitividade em um mercado cada vez mais dinâmico.
No entanto, por trás dos números e estratégias corporativas, há uma realidade que impacta diretamente o cidadão comum. A aprovação de um novo PDV, embora “voluntária”, representa incerteza para milhares de famílias de empregados. Mais alarmante é o fechamento de mil agências. Embora rotuladas como “deficitárias”, essas unidades são, em muitas localidades, o único elo entre o Estado e a população, garantindo a universalização dos serviços postais.
Os Correios, com sua capilaridade que alcança os 5.568 municípios brasileiros, além do Distrito Federal e de Fernando de Noronha, desempenham um papel crucial na vida nacional. São eles que entregam livros didáticos em escolas públicas, distribuem as provas do Enem simultaneamente em todo o país e levam urnas eletrônicas a lugares remotos. Mais do que isso, em momentos de calamidade, como as enchentes no Rio Grande do Sul ou o tornado em Rio Bonito do Iguaçu, são os Correios que garantem a chegada de mantimentos e auxílio essencial.
A promessa de expansão no e-commerce, enquanto moderniza a estatal, não pode ignorar a persistente exclusão digital que ainda assola vastas áreas do Brasil. Onde o acesso à internet é precário ou inexistente, a agência física dos Correios não é apenas um ponto de serviço, mas um centro vital para a comunidade. A prioridade pela lucratividade, embora compreensível do ponto de vista econômico, corre o risco de desmantelar a função social intrínseca a uma empresa pública.
Medidas anteriores, como a redução da jornada de trabalho em unidades administrativas e a suspensão temporária de férias, já indicavam uma pressão por austeridade que afeta diretamente o bem-estar e a motivação dos 80 mil empregados. A pergunta que se impõe é se essa busca por “eficiência e qualidade” não culminará em uma redução da qualidade e acessibilidade para aqueles que mais dependem dos serviços postais.
Como repórter do D-Taimes, continuo a investigar se essa reestruturação é um passo genuíno para a modernização dos Correios, mantendo seu compromisso social, ou se é, na verdade, um prelúdio para um desmonte que privatiza o lucro e socializa o abandono das populações mais vulneráveis. O equilíbrio financeiro é vital, mas não pode sobrepor-se à missão pública que faz dos Correios uma espinha dorsal do Brasil.
