Brasília, 6 de novembro de 2025 – Na interseção crítica entre o poder legislativo e as mais urgentes questões sociais, a Câmara dos Deputados deu um passo que ressoa com profunda preocupação para a proteção de crianças e adolescentes no Brasil. Na noite da última quarta-feira, por 317 votos a 111, foi aprovado o Projeto de Decreto Legislativo (PDL-03), que busca sustar uma resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) – uma medida que, em essência, dificulta o acesso ao aborto legal para vítimas de estupro, particularmente as mais jovens.
Como repórter e analista do D-Taimes, meu compromisso é desvendar como as decisões tomadas nos corredores de Brasília impactam diretamente o dia a dia do cidadão comum, e neste caso, a vida das mais vulneráveis: as meninas.
A resolução do Conanda, nº 258/24, tem como premissa garantir um atendimento humanizado e prioritário na rede de saúde para meninas e adolescentes que sofreram violência sexual e buscam a interrupção legal da gravidez. Entre suas diretrizes mais importantes, está a dispensa de exigências como boletim de ocorrência policial ou decisão judicial, e a comunicação aos responsáveis legais em cenários onde a violência pode ter ocorrido no próprio ambiente familiar. O objetivo é remover barreiras burocráticas e proteger a vítima de revitimização.
No entanto, a proposta aprovada na Câmara, de autoria da deputada Chris Tonietto (PL-RJ) e com parecer favorável do relator Luiz Gastão (PSD-CE), argumenta que a resolução do Conanda extrapolaria suas atribuições e contraria o Código Penal ao desconsiderar a incapacidade civil de crianças e adolescentes, que, na visão dos proponentes, exigiria a decisão dos pais ou responsáveis. A crítica se estende também à consideração de que a recusa médica em realizar o procedimento, por desconfiança da palavra da vítima, seria uma conduta discriminatória, e não objeção de consciência.
É crucial contextualizar o “cenário alarmante” que, segundo o Ministério das Mulheres, justificou a resolução do Conanda. Os números são frios e revelam uma realidade brutal: entre 2013 e 2023, o Brasil registrou mais de 232 mil nascimentos de mães com até 14 anos de idade. Estamos falando de gestações infantis, quase invariavelmente decorrentes de estupro de vulnerável. Apesar de o aborto legal ser um direito assegurado em casos de estupro, a burocracia e as barreiras sociais e institucionais fazem com que milhares de meninas sejam anualmente forçadas à maternidade. Em 2023, alarmantemente, apenas 154 meninas em todo o país conseguiram acessar esse direito.
O Ministério das Mulheres alertou que a aprovação do PDL cria um “vácuo” que dificultará ainda mais o acesso dessas vítimas ao atendimento necessário, representando um “retrocesso em sua proteção”. Mais do que isso, a pasta ressalta que a gestação forçada não apenas impede o futuro educacional – sendo a maior causa de evasão escolar feminina – mas também ceifa vidas, levando à morte de uma menina por semana no Brasil.
A resolução do Conanda, conforme a análise do governo federal, não cria novos direitos, mas “apenas detalha como aplicar a lei para salvar vidas”. Suspender esta medida, nas palavras do Ministério, “é fechar os olhos para a violência e falhar com as meninas brasileiras”.
Este embate legislativo não é apenas sobre a interpretação da lei; é um debate sobre o papel do Estado na proteção dos mais frágeis, sobre a autonomia das crianças e adolescentes em situações extremas e sobre a capacidade de um sistema de saúde de atender humanamente a quem mais precisa. A aprovação na Câmara dos Deputados agora joga a responsabilidade para o Senado, que terá em suas mãos a decisão de avançar em um caminho que pode agravar uma tragédia social já existente ou reafirmar o compromisso com os direitos humanos e a vida das meninas brasileiras.
Minha análise crítica, pautada pela apuração rigorosa dos dados e o compromisso ético de ouvir os múltiplos lados da história, me leva a questionar: a quem servem as burocracias que impedem a proteção de crianças brutalizadas? E qual o custo humano de decisões políticas que ignoram a realidade de violência e vulnerabilidade que assola milhares de lares brasileiros? O D-Taimes seguirá acompanhando de perto os desdobramentos no Senado, buscando aprofundar essa discussão e contextualizar os impactos para a nossa sociedade.
